Univ. Psychol. Bogotá, Colombia V. 11 No. 3 PP. 1013-1024 jul-sep 2012 ISSN 165

Univ. Psychol. Bogotá, Colombia V. 11 No. 3 PP. 1013-1024 jul-sep 2012 ISSN 1657-9267 1013 O Lugar de Christian Wolff na História da Psicologia* The Role of Christian Wolff in the History of Psychology Recibido: septiembre 19 de 2011 | Revisado: diciembre 1 de 2011 | Aceptado: enero 10 de 2012 Saulo de Freitas Araujo ** Universidad Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil R e s u m o Christian Wolff (1679-1754) foi uma figura fundamental não só na cultura alemã do século XVIII como também no desenvolvimento histórico da psicologia. No entanto, sua obra permanece desconhecida por grande parte dos psicólogos contemporâneos. O objetivo do presente artigo é mostrar a importância de Wolff na constituição histórica da psicologia. Inicialmente, será feita uma breve contextualização histórico-cultural do Iluminismo alemão. Em seguida, mostraremos a íntima relação entre seu projeto psico- lógico e seu sistema filosófico. Finalmente, serão destacados alguns exemplos da influência de Wolff sobre o desenvolvimento posterior da psicologia. Conclui-se que ele merece maior atenção do que tem até aqui recebido na historiografia da psicologia em geral. Palavras-chave autor: Christian Wolff, história da psicologia, historiografia da psicologia. A b s t r a c t Christian Wolff (1679-1754) was a central figure not only in the German culture from the eighteenth century, but also in the historical development of psychology. However, his work remains largely unknown by most contem- porary psychologists. The aim of this paper is to show Wolff’s important role in the historical formation of psychology. We begin by offering a brief context of German Enlightenment in its historical-cultural aspects. Afterwards the close relationship between his psychological thought and his philosophical system will be shown. Finally, a few cases that illustrate Wolff’s influence on the posterior development of psychology will be presented. We conclude that he deserves much more attention than he has received so far in the historiography of psychology in general. Key words author: Christian Wolff, history of psychology, historiography of psychology. SICI: 1657-9267(201209)11:3<1013:OLCWHP>2.0.TX;2-W Para citar este artículo: Araujo, S. F. (2012). O lugar de Christian Wolff na história da psicologia. Universitas Psychologica, 11(3), 1013-1024. * Artículo de reflexión. ** Departamento de Psicología, Universidad Federal de Juiz de Fora, Brasil. E-mail: saulo.araujo@ufjf. edu.br Saulo Araujo 1014 Uni v er sitas Psycholo gica V. 11 No. 3 ju lio-sep t iembr e 2012 Embora tenha sido um dos personagens mais in- fluentes em toda a história da cultura alemã, Chris- tian Wolff (1679-1754) não tem recebido a devida atenção por parte dos psicólogos contemporâneos. Se considerarmos, por exemplo, alguns dos livros mais utilizados no ensino de história da psicologia ao longo das últimas décadas, torna-se flagrante a pouca importância a ele atribuída. Ou seu nome não chega a ser sequer mencionado (e.g., Goodwin, 2005; Robinson, 1995; Schultz & Schultz, 2006) ou então aparece apenas de forma superficial, como um mero coadjuvante entre miríades de autores mais importantes (e.g., Boring, 1950; Hehlmann, 1967; Leahey, 1980; Mueller, 1978; Murphy, 1949; Viney & Brett King, 2003; Wehner, 1990). Boring, um dos mais destacados e influentes historiadores da psicologia, chega mesmo a afirmar que a influên- cia de Wolff sobre os psicólogos alemães foi pouco significativa (Boring, 1950, p. 246). É curioso notar, por outro lado, que essa si- tuação geral contrasta de maneira clara, por um lado, com antigos trabalhos sobre a história da psicologia alemã (e.g., Dessoir, 1901/1964; Klemm, 1911; Sommer, 1892/1966); por outro, com inves- tigações detalhadas tanto sobre a psicologia no século XVIII quanto sobre as suas raízes filosóficas em geral (e.g., Carus, 1808/1990; Mei, 2011; Mi- siak, 1961; Pongratz, 1967; Richards, 1992; Sturm, 2009; Vidal, 2006). Em ambos os casos, abundam as referências sobre Wolff e sua importância capital no desenvolvimento histórico da psicologia. Além disso, tendo em vista a reedição crítica de suas obras (Gesammelte Werke) a partir da década de 1960, surgiram trabalhos dedicados inteiramente à exposição e discussão tanto de sua filosofia quanto de sua psicologia (e.g., Bissinger, 1970; École, 1985; Gerlach, 2001; Rudolph & Goubet, 2004; Schnei- ders, 1983a). Infelizmente, porém, essa profusão de material bibliográfico parece não ter sido suficiente para produzir um impacto na concepção geral do papel de Wolff no desenvolvimento histórico da psicologia. No Brasil, a situação é ainda mais gra- ve, na medida em que há uma carência absoluta de estudos sobre o tema em questão. Partindo da situação acima descrita, o obje- tivo do presente artigo é destacar a importância do pensamento de Wolff na constituição daquilo que veio a se chamar de “psicologia científica”. Inicialmente, faremos uma breve exposição sobre a relação entre Wolff e o contexto cultural alemão do século XVIII. Logo em seguida, será apresentada a sua concepção de filosofia, destacando aí o lugar que a psicologia nela ocupa. Só então estaremos em condições de esclarecer o sentido e a importância que esta adquire, levando em conta a distinção por ele proposta entre ‘psicologia empírica’ e ‘psicologia racional’. Finalmente, ressaltaremos os aspectos que ligam o pensamento de Wolff ao desenvolvimento posterior da psicologia alemã, enfatizando a questão da continuidade histórica e intelectual na tradição psicológica. Wolff e o Iluminismo Alemão A melhor maneira de situar histórica e cultural- mente o pensamento de Wolff é relacioná-lo ao período que ficou conhecido como o “iluminismo alemão” (Aufklärung), que abrange praticamente todo o século XVIII. Se sua importância histórica não foi desde sempre reconhecida na literatura se- cundária, como mostrou Frängsmyr (1975), a idéia de que ele ocupa um lugar central nesse período da história intelectual alemã tem sido compartilhada, por outro lado, por grande parte dos historiado- res tanto da filosofia quanto da cultura em geral (e.g., Beck, 1969; Bossenbrook, 1961; Cassirer, 1932/1997; Copleston, 1960/1994; Gay, 1966/1995; Hazard, 1946/1989; Paulsen, 1895; Pütz, 1978; Schöffler, 1956; Schwaiger, 2000; Wolff, 1949; Wundt, 1945/1964). Nascido em Breslau (hoje pertencente à Polô- nia) em janeiro de 1679, Wolff teve sua educação inicial em torno das controvérsias teológicas típicas do período posterior à Reforma. Insatisfeito com as incertezas do conhecimento teológico, ele come- çou a se interessar pela certeza matemática, o que acabou levando-o a se matricular na Universidade de Jena, em 1699. Lá ele estudou filosofia natural e matemática, indo posteriormente para Leipzig, onde defendeu, em 1702, uma dissertação sobre a aplicação do método matemático aos problemas da filosofia prática (Philosophia practica universalis O Lugar de Christian Wolff na História da Psicologia Uni v er sitas Psycholo gica V. 11 No. 3 ju lio-sep t iembr e 2012 1015 mathematica methodo conscripta), tornando-se, as- sim, um Privatdozent (grau mais baixo da carreira docente nas universidades alemãs) em matemática. Seu sucesso na matemática chamou a atenção do já famoso Leibniz (1646-1716), que o recomendou à Universidade de Halle, onde foi nomeado Professor em 1706. Em Halle, no entanto, seus cursos come- çaram a incomodar os teólogos pietistas daquela instituição, que o acusavam de defender o ateísmo e o determinismo. Em 1723, Frederico Guilherme I, rei da Prússia, decretou sua expulsão não só daque- la universidade, mas do território prussiano como um todo, e posteriormente proibiu que seus livros fossem utilizados e ensinados nas instituições prus- sianas. Wolff foi para a Universidade de Marburg, onde lecionou pelos próximos 17 anos e publicou suas obras mais importantes. Em 1740, após assumir o trono deixado pelo pai, Frederico o Grande cha- ma Wolff de volta a Halle. Já com fama e prestígio, ele foi aclamado e recebido como herói pelo povo. Passou o resto de seus dias em Halle, vindo a falecer em abril de 1754 (Beck, 1969). Ao longo de sua prolífica e bem sucedida carrei- ra profissional, Wolff deu contribuições seminais à cultura alemã. Em primeiro lugar, deve-se ressaltar o grande serviço que prestou à transmissão do co- nhecimento matemático. Embora alguns tratados sobre ramos individuais da matemática já tivessem sido publicados em alemão anteriormente, seus manuais foram os primeiros a abranger toda a ma- temática de seu tempo e estabeleceram um voca- bulário matemático básico para a língua alemã, que foi prontamente adotado nas universidades e ainda hoje permanece praticamente intacto (Blackall, 1959; Tonelli, 1967). Foi, porém, no campo da filosofia que as reali- zações de Wolff tiveram um impacto ainda maior. Assim como no caso da matemática, ele também estabeleceu a terminologia básica da filosofia ale- mã com seus tratados publicados entre 1713 e 1726 em alemão (Blackall, 1959). Por si só isso já seria suficiente para assegurar sua importância no ilu- minismo alemão. Mas ele ocupa também um lugar de destaque na principal discussão metodológica da filosofia alemã do século XVIII, a saber, o papel do método matemático na construção do conheci- mento filosófico (Ciafardone, 1983; Engfer, 1983; Frängsmyr, 1975; Tonelli, 1959) – um tema central na virada crítica de Kant (1781/1995). Pouco após sua expulsão de Halle em 1723, Wolff iniciou a fase que lhe rendeu mais fama e prestígio: a publicação de seu sistema de filosofia em latim. Vários alunos, vindos de toda a parte da Europa, chegaram a Marburg para ouvir suas pre- leções. Foi entre 1728 e 1740 – antes de regressar uploads/Litterature/ 1662-texto-del-articulo-14113-1-10-20121122.pdf

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