DIONYSOS REDIVIVUS1 Michel Maffesoli2 Sociológo Professor Catedrático da Univer
DIONYSOS REDIVIVUS1 Michel Maffesoli2 Sociológo Professor Catedrático da Université Paris-Descartes – Sorbonne Membro do Institut Universitaire de France Diretor e pesquisador do Centre d’Etude sur l’Actuel et le Quotidien (CEAQ/Sorbonne, Paris V) * Tradução de Murilo Duarte Costa Corrêa Advogado Professor do Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas da Fundação de Estudos Sociais do Paraná (CCSA/FESP) Mestre em Filosofia e Teoria do Direito pelo Curso de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (CPGD/UFSC) Graduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (FD/UFPR). 1 O presente artigo teve sua tradução ao português, e posterior publicação, gentilmente autorizadas à RDF por Michel Maffesoli. 2 Dentre outros, é autor dos seguintes livros, traduzidos para o português: O instante eterno, A república dos bons sentimentos, A parte do diabo, O tempo das tribos: o declínio do individualismo, O ritmo da vida, Elogio da razão sensível, O mistério da conjunção: ensaios sobre comunicação, corpo e socialidade, A transfiguração do político: a tribalização do mundo e A Sombra de Dionisio, por diversas editoras brasileiras. L’actuel n’a de sens que par le quotidien, c’est-à-dire l’impermanent. On ne comprend ce qui advient que si l’on sait saisir ce qui est inaugural. Voilà pourquoi toute pensée authentique reprend une spécifcité de l’existence humaine : on sème pour plus tard. C’est ainsi qu’à la fin des années 70 j’annonçais le retour de Dionysos, dieu de l’orgie, soulignant ainsi le rôle, de plus en plus important, que la passion (orgé) allait jouer dans nos sociétés. De même, en référence à un autre sens du mot (orgos: initié), j’indiquais la place primordiale que l’initiation allait prendre dans le néotribalisme contemporain. Qu’était-ce à dire, sinon qu’à l’encontre de ce qu’il était convenu et demeure de dire, il y a de l’énergie dans la vie sociale ? Mais il faut reconnaître, même si cela ne manque pas de chagriner nombre d’observateurs, que cette énergie s’exprime à la fois dans la proximité, dans la quotidienneté, dans la recherche d’un hédonisme de bon aloi. En tout cas, hors des institutions rationnelles, terrain de prédilection de la sociologie moderne. Il est ainsi fréquent d’entendre parler d’hyperconsommation. Encore une de O atual não tem sentido senão pelo quotidiano; isto é, o impermanente. Não compreendemos o que advém se não soubermos apreender aquilo que é inaugural. Eis porque todo pensamento autêntico retoma uma especificidade da existência humana: nós semeamos para mais tarde. É assim que no fim dos anos 70 eu anunciei o retorno de Dionísio, deus da orgia, sublinhando assim o papel, cada vez mais importante, que a paixão (orgé) teria adquirido em nossas sociedades. Da mesma forma, em referência a um outro sentido da palavra (orgos: iniciado), indiquei o lugar primordial que a iniciação tomaria no neotribalismo contemporâneo. Que quer isso dizer, senão que de encontro a isso que se convencionou, e se continua a dizer, persiste a energia no interior da vida social? Porém, é necessário reconhecer, mesmo que isto não deixe de incomodar numerosos observadores, que essa energia se exprime, por sua vez, na proximidade, na quotidianeidade, na procura por um hedonismo de boa qualidade; em todo caso, essa energia se exprime fora das instituições racionais – terreno de predileção da sociologia moderna. É deveras comum ouvir falar de hiper-consumo.3 Novamente, trata-se de um 3 [N. do T.]: Nesse ponto, Michel Maffesoli parece endereçar uma crítica a Gilles Lipovetsky, filósofo francês, professor da Université de Grenoble, e inaugurador do conceito de hipermodernidade, que defende que a pós-modernidade não passaria da exacerbação de características ainda demasiadamente modernas. Por isso, a utilização do prefixo hiper em hipermoderno, ou em hiperconsumo, por exemplo. Lipovetsky escrevera, dentre outros livros, A Era do Vazio: ensaios sobre o individualismo contemporâneo, A felicidade paradoxal, O luxo eterno: da idade do sagrado ao tempo das marcas, O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas e A sociedade da decepção. ces exagérations qui s’emploient à masquer le fait que nous sommes passés à autre chose ! Pour peu que l’on ne soit pas aveuglé par le conformisme ambiant, il est évident que la fringale d’objets, l’obsolescence rapide des amours, la frénésie de la nouveauté, tout cela devrait nous inciter à nommer autrement le vertigineux papillonnage caractérisant les manières d’être postmodernes. Georges Bataille, avec sa notion de dépense en avait, prophétiquement, esquissé les contours. Mais de nos jours, la consumation, le fait de brûler la vie par tous les bouts, est devenue une réalité quotidienne qui est aux antipodes de la mythologie du progrès propre à la modernité. C’est bien par l’invention d’un mythe, celui du Progrès, qu’Auguste Comte, tout comme Saint-Simon, voulait lutter contre l’obscurantisme propre, selon eux, aux divers polythéismes, puis aux monothéismes sémitiques. On se souvient chez Saint-Simon de « la Religion industrielle ». Celle-ci, - en est-on assez conscient ? - devait conforter le tout productivisme moderne, sa grande idéologie de la croissance. Et la société de la production, telle qu’elle se mit en place tout au long du XIXe et au début du XXe siècle, ne pouvait qu’aboutir à cette desses exageros empregados a fim de mascarar que nós nos tornáramos outra coisa! Por temor de que já não mais sejamos cegados pelo conformismo ambiente, é evidente que a avidez por objetos, a rápida obsolescência dos amores, o frénésie da novidade, tudo deverá nos incitar a nomear diferentemente o vertiginoso borboletear que caracteriza os modos de ser pós-modernos. Georges Battaille, com sua noção de despesa, pudera, profeticamente, esboçar tais contornos. Entretanto, em nossos dias, o consumo, o fato de “torrar” a vida por todos os lados, tornou-se uma realidade quotidiana que se encontra nas antípodas da mitologia do progresso próprio à modernidade. Justamente pela invenção de um mito, o do Progresso, que Auguste Comte, assim como Saint-Simon, quisera lutar contra o obscurantismo próprio aos diversos politeísmos, segundo eles, e então contra o obscurantismo próprio aos monoteísmos semitas. Lembramos em Saint-Simon da “Religião Industrial”. Ela – estamos suficientemente conscientes? – deveria confrontar o todo produtivismo moderno, sua grande ideologia do crescimento. Ademais, a sociedade de produção, tal como se põe em prática durante todo o século XIX, e início do século XX, não poderia senão conduzir a esta sociedade de consumo tão bem analisada por Jean Baudrillard, que enxergava, société de consommation si bien analysée par Jean Baudrillard qui voyait précisément en celle-ci, dans un de ses livres, moins connu, mais particulièrement percutant, le miroir de la production. Toute mythologie a besoin de termes qui soient de véritables oscillographes, qui lui servent de curseurs. Ces termes constituent une sorte de caisse de résonance, en laquelle tout un chacun peut, aisément, se reconnaître. Fût-ce inconsciemment. La trilogie Progrès, Production, Consommation, eut exactement cette fonction. Ces mots-clefs faisant écho aux préoccupations populaires et fondant la mythologie moderne. Mais ils sont devenus de simples incantations. À savoir des termes qu’on on continue de nous seriner lors de divers discours ofciels. Qui se chantent religieusement en toute occasion. Qui font partie de l’opinion commune, de la rhétorique routinière. Mais auxquels, pour cette raison même, on ne prête plus grande attention. On le sait d’antique mémoire : litanie, liturgie, léthargie ! Nombreux, en efet, sont les indices contredisant l’assoupissement de la société instituée et prenant le contrepied des discours ou analyses convenus lui servant de légitimation et de rationalisation. precisamente nela, em um de seus livros mais conhecidos, mas particularmente impressionante, o espelho da produção. Toda mitologia tem necessidade de termos que são verdadeiros oscilógrafos,4 que lhe servem de cursores. Esses termos constituem uma espécie de caixa de ressonância na qual todo mundo pode, facilmente, reconhecer-se. Isto o fora inconscientemente. A trilogia Progresso, Produção, Consumo, possuía exatamente essa função – suas palavras-chave fazendo eco às preocupações populares e fundando a mitologia moderna. Todavia, elas se tornaram simples encantos. A saber, os termos que continuamos a assoviar em diversos discursos oficiais, que se cantam religiosamente em toda ocasião, que são parte da opinião comum, da retórica rotineira. Porém, e por esta mesma razão, nós não lhes prestamos grande atenção. Nós os sabemos de antiquada memória: litania, liturgia, letargia! Com efeito, numerosos são os indícios contradizendo o torpor da sociedade instituída e tomando o contrapé dos discursos ou análises acordados, servindo-lhes de legitimação e de racionalização. É frequente que um valor que se realiza conheça, in fine, uma reincandescência.5 E nos lembraremos do legendário canto do cisne por meio do qual 4 [N. do T.]: Oscilógrafo é um aparelho que permite observar e registrar as variações de uma corrente elétrica variável em função do tempo. 5 [N. do T.]: No original, “retour de flamme”, que exprime o momento em que uma brasa reacende. Il est fréquent qu’une valeur qui s’achève connaisse, in fine, un retour de flamme. Et l’on se souvient du légendaire chant du cygne par lequel ce dernier, en mourant, transforme son cri rauque en langoureuse, mais bien inutile, mélodie. C’est bien ainsi que l’on peut comprendre les diverses chansonnettes sur la valeur travail, et autres complaintes sur le taux de uploads/Litterature/ maffesoli-m-dionysos-redivivus-pdf.pdf
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- Publié le Oct 28, 2022
- Catégorie Literature / Litté...
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