A literatura moderna como observação de segunda ordem. Uma introdução ao pensam

A literatura moderna como observação de segunda ordem. Uma introdução ao pensamento sistêmico de Niklas Luhmann. Michael Korfmann (•) ZUSAMMENFASSUNG Dieser Artikel beschäftigt sich mit der Relevanz der Systhemtheorie Niklas Luhmanns (1927 – 1998) für die Literaturwissenschaften. Ausgangspunkt ist eine historische Analyse, die die Zeit um 1800 als Höhepunkt der Entwicklung von einer stratifizierten hin zu einer moderner Gesellschaftsstruktur begreift, die durch die Ausdifferenzierung von Funktionssystemen wie Wirtschaft, Erziehung, Recht oder Literatur gekennzeichnet ist. In Deutschland reflektiert die romantische Poetik diesen Prozess. Literarische Kommunikation wird als Beobachtung zweiter Ordnung aufgefasst, die zwischen dem Aktuellem und Potenziellem oszilliert und so Ordnungsformen deutlich macht. Gleichzeitig wird das autonome und ausdifferenzierte Literatursystem von seiner Umwelt beobachtet. Die Literaturgeschichte des 19. Jahrhunderts instrumentalisiert es für politische Ziele, während das neue Urheberrecht und das Buch als Ware zu einer gesteigerten Dynamik der literarischen Produktion beitragen. Stichwörter: Niklas Luhmann, Systemtheorie, moderne Literatur. ABSTRACT This study is an introduction to the system theory developed by the G erman sociologist Niklas Luhmann (1927 – 1998) and its significance for literary studies. It parts from a historical point of view which understands the period around 1800 as the climax of the transformation from a stratified european society into a modern society of a social order structured by differentiated systems such as education, economy, law or literature, each with its specific function and characterized by its typical form of communication. In Germany, the sistem of literature reflects this process in the poetology of the romantic writers. Literary comunication is defined as a second order observation that oscilates between the actual and potencial and sharpens the view for forms of order. The autonomous and differentiated system of literature becomes a field that is being observed by its environment. The history of literature in the 19th century instrumentalizes it for political goals, while the new copyright laws and the idea of the book as a profitable merchandise imbued the system of literature with an accelerated dynamic. Keywords: Niklas Luhmann, sistem theory, modern literature. • (*) Professor IL/UFRGS. Endereço para correspondência: UFRGS Instituto de Letras/Setor de Alemão Avenida Bento Gonçalves, 9500. 91509-970 Porto Alegre, R.S. Endereço eletrônico: michael.korfmann@ufrgs. 2 1. Introdução O sociólogo alemão Niklas Luhmann (1927-1998) desenvolve, desde meados dos anos 60, sua teoria dos sistemas, reclamada pelo próprio autor como “teoria universal” (1988, p. 292) e caracterizada por seu oponente, Habermas, como “metateórica” (1985; p. 443). Sua vasta obra de 63 livros e 419 artigos1 incorpora influências, sobretudo, de concepções que vêm das chamadas ciências exatas, especificamente da biologia, na adaptação de conceitos como observador, autonomia e autopoiésis, dos biólogos chilenos Maturana e Varela, e da matemática, especificamente do livro Law of forms, de Spencer Brown (1969) e culmina na sua última publicação, os dois volumes de A sociedade da sociedade (1997). Se, de um lado, consta-se uma “discussão intensa“ (Berg, 2000, p. 175) de suas idéias na teoria literária alemã, no Brasil, a sua recepção restringe-se, sobretudo, para o campo da sociologia, destacando-se a introdução editada por Clarissa Baeta Neves e Eva Machado Barbosa Samios2. A respeito da arte, existe apenas um artigo do próprio Luhmann, “A obra de arte e a auto-reprodução da arte”, traduzido por Heidrun Krieger Olinto na sua coletânea Histórias da Literatura, de 1996, e outro, de cunho crítico, do germanista alemão da Universidade de Stanford, Hans Ulrich Gumbrecht, conferencista freqüente no Brasil, intitulado “Patologias no Sistema da Literatura” (1998). Não cabe aqui discutir se o trabalho de Luhmann não encontrou uma ressonância maior no Brasil por falta de traduções disponíveis ou rejeição de conteúdo, mas precisa-se levar em conta que a teoria funcional e sistêmica do sociólogo alemão resulta de uma vivência social e biográfica bastante diferente daquela do contexto brasileiro, como mostram os comentários do próprio Luhmann a respeito de sua estada neste país. Se pode-se partir de uma tendência da sociedade européia a uma inclusão total da população na qual deveres, como escolaridade, seguros ou documentação, e direitos, como votação, propriedade ou informação, tentam oferecer um instrumentário para tal e se uma eventual exclusão precisa de uma legitimação específica e onde doentes, fracos, pobres, desempregados ou perturbados não são banidos ou expulsos mas terapeutizados, tratados, subvencionados ou atualizados profissionalmente, o próprio Luhmann descreve, na ocasião de sua visita ao Brasil, como uma exclusão em escala maior muda a percepção do indivíduo referente ao 3 ambiente. Ele não é mais concebido pelo aspecto funcional, mas a funcionalidade esperável é substituída pela observação corporal: Quando, por exemplo, se visita grandes cidades brasileiras e se movimenta em ruas, praças ou praias, um observar constante da posição, distância e acumulação de corpos faz parte da competência social obrigatória. [...] Existe uma certa percepção guiada pelo instinto que contribui para que se reconheça e se evite perigos. Tudo que nós [europeus] compreenderíamos como pessoa, retrocede e com isso também as tentativas de obter efeitos sociais através do influenciar de posições e atitude, pois estes precisariam de um contexto de controle e convicções sociais inexistente aqui (Luhmann, 1995a, p. 262). Não podemos aqui discutir se as estruturas sociais brasileiras são resultado da chamada globalização e até que ponto esta pode ser vista como expansão dos sistemas funcionais3 em nível mundial, mas precisa-se, portanto, ressaltar que trabalhar, na área literária, com a teoria dos sistemas de Luhmann, implica elaborar uma visão que não se restringe apenas investigar o campo literário em separado, através do instrumentarium teórico extraído das publicações de Luhmann, mas se torna necessário abordar a literatura moderna dentro da concepção social que se originou no contexto europeu. 2. O aspeto histórico Referente ao aspeto histórico, Luhmann parte da constatação de que, por volta de 1800, intensifica-se um processo de mudança de uma sociedade européia socialmente estratificada em direção a uma ordem social caracterizada por sistemas funcionais autônomos, ou seja, de uma ordem social hierárquica e estática para a sociedade moderna caracterizada por sistemas funcionais de tarefas específicas e estruturada por comunicações diferenciadas. A sociedade européia pré-moderna, estratificada e formada por classes que determinaram, de forma limitadora, as possibilidades de participação social, cede, a partir do século XV/XVI, gradualmente a uma reestruturação em direção a sistemas funcionais dos quais o indivíduo pode e deve participar. Isso não quer dizer que camadas sociais mais ou menos favorecidas tenham sido eliminadas, mas a origem familiar e social como base de identidade é substituída pelo conceito de formação ( Bildung): a integração social ocorre através da carreira individual que, por sua vez, resulta da participação em organizações funcionais como escola, universidade ou empresa. A camada social de origem pode ser desfavorável ao indivíduo e até mesmo um obstáculo para ele, mas não serve mais como 4 forma primária de estruturação da sociedade. Em lugar da diferenciação estratificatória em classes ou camadas sociais, a sociedade diferenciada funcionalmente organiza-se em áreas como ciência, economia, política, religião, direito, educação, arte etc., onde cada um desses sistemas exerce uma função específica e exclusiva e exige a pessoa, o indivíduo, apenas como participante temporário e parcial. A primazia funcional nos diversos sistemas funcionais referente à economia, à política, à religião e, mais tarde, à ciência e educação, se transforma em axiomas, norma dominante e, ao mesmo tempo, os outros sistemas parciais começam a aceitar isso como fato de seu ambiente e como condições de suas próprias especificações (Luhmann, 1980, p. 162). Estas especificações levam a duas características da diferenciação funcional dos sistemas sociais: o interesse pelos autoprocessos e por questões relativas ao tempo. Sabe-se que no século XVIII cresce, de uma maneira notável, o fascínio por processos direcionados a si mesmos: o pensamento do pensamento, o autoconhecimento, o sentir do sentimento e o auto-engano. Na segunda metade do século XVIII, esse interesse se condensa para trabalhar problemas reflexivos próprios dos sistemas, como por exemplo, a justificativa do direito positivo ou da literariedade, a auto-organização da economia, aprender a aprender no sistema educativo e outros. Com isso, a autonomia auto-referencial tomou “definitivamente o lugar ocupado anteriormente pela interpretação religiosa do mundo” (Luhmann, 1985, p. 610). Assim, a sociedade moderna consiste de diversos sistemas funcionais diferenciados onde cada um se torna ambiente para os outros: a política não pode ser substituída pela ciência e nem a religião pela economia. Essa estruturação funcional diferencia a sociedade moderna de suas precursoras históricas. Ao organizar-se por funções, ela reduz a redundância do sistema. Instituições multifuncionais, especificamente a família e a moral, tornam-se secundárias, e a segurança por elas fornecidas, menos eficaz. Nenhum desses sistemas parciais pode assumir as funções do outro: a ciência não é capaz de solucionar os problemas da religião, e essa não pode assumir os da educação. Entretanto, esses sistemas funcionais dependem fortemente um do outro, sem que essa dependência mútua possibilite assumir ou descarregar funções alheias. Com isso, aumentam evidentemente os riscos estruturais e as possibilidades de avarias para esse sistema social. A renúncia à redundância e à segurança múltipla é compensada pelo aumento da capacidade de produção, de aprendizagem e de adaptação dos sistemas funcionais. A razão da eficiência maior e o tempo acelerado das mudanças 5 uploads/Litterature/ teoria-dos-sistemas-a-literatura-como-observacao-de-segunda-ordem.pdf

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