Revista de Geografia (Recife) V. 38, No. 3, 2021 DOI: 10.51359/2238-6211.2021.2

Revista de Geografia (Recife) V. 38, No. 3, 2021 DOI: 10.51359/2238-6211.2021.242889 Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional. CC BY - permite que outros distribuam, remixem, adaptem e criem a partir do seu trabalho, mesmo para fins comerciais, desde que lhe atribuam o devido crédito pela criação original. Soares e Aragão, 2021 ISSN 0104-5490 1 PKS PUBLIC KNOWLEDGE PROJECT https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistageografia OJS OPEN JOURNAL SYSTEMS AS DUAS FORMAS DE SABERES: DA ETIMOLOGIA AOS SIGNIFICADOS DE VERNACULAR E VEICULAR EM GEOGRAFIA José Wellington Lúcio Soares¹, Raimundo Freitas Aragão² ¹Universidade Estadual do Ceará (UECE). Licenciado em Geografia. Especialista em Educação. Mestre em Geografia. Doutor em Geografia. E-mail: zezinflauta@hotmail.com; http://orcid.org/0000-0002-0079-5857 ² Universidade Federal do Ceará (UFC). Mestre e Pós-Doutor em Geografia pela Universidade Federal do Ceará. Licenciado em Filosofia e Bacharel em Geografia. Especialista em educação Ambiental. E-mail: ararageo2007@yahoo.com.br; http://orcid.org/0000-0002-3428-0712 Artigo recebido em 03/10/2019 e aceito em 11/03/2021 RESUMO Propõe-se neste artigo apresentar duas formas complementares de saberes ainda poucos debatidos na Geografia acadêmica brasileira, quais sejam: o saber vernacular e o saber veicular. O primeiro referente ao saber popular e o segundo ao saber científico. A base do procedimento metodológico é o de pesquisa bibliográfica com o suporte de diferentes trabalhos científicos pluridisciplinares, ou seja, utiliza-se não só autores geógrafos. Tais trabalhos são utilizados como ferramentas básicas de estudos monográficos considerados essenciais quando se busca o domínio sobre determinado tema. Espera-se que o artigo contribua para a ampliação do conhecimento no que toca aos saberes que envolvem o mundo da pesquisa acadêmica geográfica. Palavras-chave: Vernacular; Veicular; Geografia; Paisagem; Patrimônio. TWO WAYS OF KNOWLEDGE: FROM ETYMOLOGY TO THE MEANINGS OF VERNACULAR AND VEHICULAR IN GEOGRAPHY ABSTRACT It is proposed in this article to present two complementary forms of knowledge that are still little debated in Brazilian academic geography, namely: vernacular knowledge and vehicular knowledge. The first refers to traditional beliefs and, the second to scientific knowledge. The methodological procedure is that of bibliographical research with the support of different multidisciplinary scientific works, not only geographical authors used. Such works are basics tools for monographic studies considered essential when seeking mastery over a particular topic. Hopefully, it’s expected that the article will contribute to a better opening in the spread of knowledge regarding the knowledge that involves the world of geographic research. Key-words: Vernacular; Vehicular; Geography; Landscape; Heritage. Revista de Geografia (Recife) V. 38, No. 3, 2021 Soares e Aragão, 2021 ISSN 0104-5490 2 LES DEUX FAÇONS DE SAVOIR: DE L'ÉTYMOLOGIE AUX SIGNIFICATIONS DU VERNACULAIRE ET DU VÉHICULAIRE EN GÉOGRAPHIE. RÉSUMÉ Il est proposé dans cet article de présenter deux formes de savoirs complémentaires encore peu débattues en géographie académique brésilienne, à savoir: les savoirs vernaculaires et les savoirs véhiculaires. Le premier renvoie aux savoirs traditionnelles et le second aux connaissances scientifiques. La démarche méthodologique est celle d'une recherche bibliographique avec l'appui de différents travaux scientifiques pluridisciplinaires et non seulement les auteurs géographiques sont utilisés. Tels travaux sont des outils de base pour des études monographiques considérées comme essentielles lorsqu'on cherche à maîtriser un sujet particulier. On s'attend à ce que l'article contribuera à une meilleure ouverture dans la diffusion des connaissances concernant les connaissances qui impliquent le monde de la recherche géographique. Mots-clés: Vernaculair; Véhiculair; Géographie; Paysage; Patrimoine. INTRODUÇÃO Este artigo tem como objetivo central o de apresentar os termos “vernacular” e “veicular” não comuns no âmbito do ensino acadêmico geográfico brasileiro. A ideia surgiu a partir das pesquisas realizadas pelo professor geógrafo da Universidade Estadual do Ceará – UECE, Dr. Otávio José Lemos Costa que, desde 2001, o qual vem trabalhando como pesquisador e orientador sobre os temas patrimônio e paisagem, concentrando-se sobre o “patrimônio vernacular” do Sertão cearense a exemplos das regiões de Icó, localizado na mesorregião do Centro-Sul do estado e do maciço residual da Serra da Meruoca, na porção Noroeste do Ceará. A partir do levantamento bibliográfico e leitura sobre vernacular surgiu a sua imagem complementar, o veicular. Por isso, da curiosidade sobre o vernacular ou conhecimento comum fez-se necessário remeter sobre o termo veicular, ligado ao mundo acadêmico. Questionou-se, então: o que é verdadeiramente vernacular, qual sua origem? Como evoluiu e como a Geografia dele se apropria? E o seu complemento, quais relações mantém com o vernacular? São estas as questões a serem respondidas neste artigo. O procedimento metodológico é a pesquisa bibliográfica e tem como suporte obras que versam diretamente sobre o objeto de estudo. Tais obras são utilizadas como ferramentas de procedimentos básicos de estudo monográficos, considerados essenciais no domínio de Revista de Geografia (Recife) V. 38, No. 3, 2021 Soares e Aragão, 2021 ISSN 0104-5490 3 determinado tema. Dessa forma, os conhecimentos geográficos “vernacular” e “veicular” são parcialmente dissecados. Os autores, todos de linhagem acadêmica, e não necessariamente geógrafos, são postos a refletirem e dialogarem sobre os termos. O artigo está dividido em seis partes. A primeira trata-se desta introdução. A segunda traz, em primeira mão, as considerações do geógrafo francês Claude Raffestin, o qual pode ser considerado um dos primeiros a refletir sobre os termos em um artigo em Geografia. Na terceira, realiza-se o levantamento etimológico de vernacular, como e onde nasce e se diferencia ao longo da história. Na quarta, em artigo mais recente, a geógrafa francesa Béatrice Collignon (2005; 2014) reflete sobre as características dos termos e presenteia a academia com sua própria concepção de vernacular e veicular. É o que também faz o geógrafo francês Jêróme Monnet (1999a; 1999b) na quinta parte. Ambos oferecem uma noção muito próxima, porém divergindo metodologicamente. A sexta parte são as considerações finais. O COMEÇO: A CAPTURA DOS TERMOS PELO GEÓGRAFO CLAUDE RAFFESTIN Os artigos intitulados “La langue comme ressource: pour une analyse économique des langues vernaculaires et vehiculaires” e “Langue et territoire. Autour de la géographie culturelle” do geógrafo francês Claude Raffestin (1978; 1995) utilizam os vocábulos vernacular e veicular e sua inserção em Geografia, diferenciando-os. Pode-se sugerir que Raffestin foi um dos pioneiros em trazer um estudioso da linguística para explicar um fenômeno e colocá-lo em um contexto geográfico1. Nesses artigos, Raffestin (1978) traz a linguística de Henri Gobard de maneira formal, ou seja, para diferenciar os termos em suas funções, mesmo porque considera uma língua dominante não como fato linguístico propriamente, mas “[...] um problema social lato sensu que, para ser posto, necessita de mobilização de dados sobre relações políticas, econômicas, sociais e culturais. Em outros termos, é um problema de poder, de relações de poder e de estrutura de poder.” (RAFFESTIN, 1978, p. 279). Portanto, para além de uma questão de linguística, a posição da língua, segundo ele, é também uma questão espacial e territorial. A 1 Collignon (2005) aponta a “geografia do espaço vivido” desenvolvida por Armand Fremont, no ano de 1974, como germe sobre geografia vernacular. No entanto diz ela, ter se tratado senão de germe. Revista de Geografia (Recife) V. 38, No. 3, 2021 Soares e Aragão, 2021 ISSN 0104-5490 4 língua, como diz, é um desafio, um recurso, pois está diretamente ligada à produção e ao consumo. Está ligada ao mesmo tempo a um processo e a uma atividade territorial. Língua e território estão presentes em todas as ações coletivas e individuais igualmente: é difícil imaginar situações nas quais língua e território não sejam parte interessada de uma maneira ou de outra, nas quais seus “mediadores” não tenham algum papel enquanto meios ou fins (RAFFESTI, 1995, p. 90). Paradoxalmente, a origem da língua não é um problema linguístico e simetricamente a origem do território não é um problema geográfico. Em efeito, pode-se desconhecer a origem da língua e do território e ainda submeter essas duas produções a análises tanto precisas quanto esclarecedoras. Essa maneira de se desembaraçar do problema pode não ser elegante, mas é possível compensar essa relevância pelos recursos, justamente, no limite, pois sem delimitação não há nem língua e nem território. (RAFFESTIN, 1995, p. 94). Para sustentar essa teoria de língua como poder no contexto territorial, ele apresenta as quatro funções da língua na reprodução social, apresentadas da seguinte forma levando em consideração a distinção de Henri Gobard: a primeira é a língua vernacular, a falada no local, ou seja, na casa, na rua, e espontaneamente para se comunicar; a segunda é a língua veicular, de alcance mais amplo, nacional ou regional, realizada pela necessidade; pode ser utilizada no lugar de trabalho e de estudo. Esse alcance abrange as comunicações na escala entre cidades; a terceira é a língua referência, esta ligada às tradições culturais, orais ou escritas, nas quais asseguram as continuidades dos valores para uma referência sistemática às obras do passado; a quarta, e última, é a língua mítica. Esta última funciona como último recurso, uma espécie de mágica verbal a qual compreende-se a incompreensibilidade como prova irrefutável do sagrado. Ao refletir sobre o território do cotidiano locus onde se realiza a vida corrente, daquilo que é “evidente” (ce qui va de soi), retomando essa expressão de Henri Lefebvre na língua original, Raffestin (1995, p. 91) expõe a tradução de vernacular para o contexto da Geografia com o aporte da linguística. A este território corresponde uploads/Geographie/ 1-pb 2 .pdf

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