Alain Choppin Durante muito tempo negligenciada, a literatura escolar suscitou,
Alain Choppin Durante muito tempo negligenciada, a literatura escolar suscitou, nos últimos vinte anos, um vivo interesse entre os historiadores. Após expor as causas desse desinteresse e os motivos pelos quais se multiplicam atualmente no mundo os trabalhos sobre o livro e a edição escolares, o autor tenta mostrar a riqueza e a complexidade da fonte histórica que constituem os manuais. Esboça um histórico crítico da pesquisa internacional e tenta, a partir daí, tirar as principais tendências atuais. Traça um paralelo entre a pesquisa historiográfica tradicional e nacional, fundamentada sobre o postulado da eficiência do manual, e uma pesquisa histórica globalizante, que tomando em conta o conjunto contextual, prende-se a uma concepção "ecológica" do manual. Após haver indicado algumas das dificuldades de natureza metodológica, com as quais os pesquisadores podem se deparar, o autor lembra que o manual é antes de mais nada um instrumento - em suma complexo -, e que a análise de seus conteúdos é indissociável de seus usos, reais ou supostos. O artigo apresenta uma abundante bibliografia internacional. Palavras-chaves: História da Educação; Manuais Escolares; Edição e Editores; Análise de Conteúdo; Metodologia. Longtemps négligée, Ia Iittérature scolaire scolaire suscite depuis une vingtaine d'années un vif intérêt chez les historiens. Apres avoir exposé les causes de cette désaffection et les motifs pour lesquels se multiplient aujourd'hui dans le monde les travaux sur le livre et I' édition scolaires, I' auteur tente de montrer Ia richesse et Ia complexité de Ia source historique que constituent les manuels. fi brosse un historique critique de Ia recherche internationale et tente d'en dégager les principales orientations actuelles. fi oppose une recherche historiographique traditionnelle et nationale, fondée sur le postulat de I' efficience du manuel, et une recherche historique globalisante, qui, prenant en compte l'ensemble du contexte, s'attache à une conception « écologique» du manuel. Apres avoir indiqué quelques-unes des difficultés de nature méthodologique auxquelles peuvent être confrontés les chercheurs, l'auteur rappelle que le manuel est avant tout un outil - au demeurant complexe - et que l'analyse de ses contenus est indissociable de celle de ses usages, réels ou supposés. L' article comporte une bibliographie internationale nourrie. Mots-clefs: Histoire de l'éducation; Manuels scolaires; Edition et éditeurs; Analyse de contenu; Méthodologie . 1 "L'historien et le livre scolaire", especialmente escrito para a revista História da Educação. Tradução de Maria Helena Carnara Bastos. Durante muito tempo negligenciada, a pesquisa histórica sobre o livro e a edição escolares conhece, há uns vinte anos, avanços consideráveis em um número cada vez mais significativo de países. O fato da Associaçiio Internacional de Historiadores da Educação (ISCHE) consagrar seu último congresso ao tema "O livro e a Educação" constitui, assim, um testemunho inequívoco.2 Mas por que esse campo de investigação esteve por tanto tempo abandonado e provoca, somente agora, tanto interesse? Quais foram e quais são as principais obras, as principais orientações? Que cuidados se impõem ao historiador que toma os manuais escolares como objeto de estudo? O descaso que os bibliógrafos ou amadores de livros tiveram pelos manuais não surpreende em nada. Vários fatores concorreram para suscitar e manter esse desinteresse. Alguns decorrem do próprio status do manual. Inicialmente, para os contemporâneos, alunos, pais ou, a fortiori, professores, os livros escolares participam do universo cotidiano: eles não apresentam nada de raro, exótico, singular; parecem mesmo intemporais, na medida em que transcendem a clivagem entre as gerações. Essa banalidade, familiaridade, proximidade conferem às obras escolares menos valor visto que são produzidas, hoje em grande quantidade, dezenas de milhões de exemplares, atualmente, em países como a França3•.•, ou, até mesmo, bilhões de exemplares, como na China 4. O considerável volume de tiragens, mas também as subvenções, diretas ou indiretas, cuja produção é beneficiada, em grande número de países, contribuem para fazer dos manuais escolares produtos editoriais comparativamente pouco onerosos e, portanto, pouco valorizados. Os livros escolares são também mercadorias perecíveis. Perdem todo valor de mercado assim que uma mudança nos métodos ou nos programas fixam sua prescrição ou, ainda, quando fatos atuais impõem-Ihes 2 «El Libro y Ia Educación ». XXITe Congrês de nSCHE (International Standing Conference of the HislOriaos ofEducation). Alcalá de Henares (Espagne), 6-9 septembre 2000. 3 Em 1999, a produção francesa elevou-se à 71,2 milhões de exemplares (Fonte: Syndicat national de l'édition. L'édition de livres en France. Paris: SNE, p.37). 4 Um pouco mais de dois bilhões e meio para o ano de 1996. modificações, como ocorreu após a queda do muro de Berlim ou, como acontecerá no próximo ano, na maioria dos países da União Européia, por ocasião da passagem ao euro. Também, nas sociedades ocidentais modernas, os livros escolares são vistos pelos contemporâneos como objetos de consumo pedagógico: é assim que os produtos do setor paraescolar/paradidático (os anais de exame, os cadernos de férias, ete.) são hoje assimilados desde os profissionais até os "consumidores". Os livros de classe são também vítimas de seu sucesso: o desenvolvimento da instrução popular, a instauração do princípio da obrigatoriedade escolar em um grande número de países industrializados e, mais recentemente, a democratização do ensino e a extensão da escolarização, levaram a uma produção editorial cada vez mais massiva. Por outro lado, a hierarquização dos níveis de ensino, a multiplicação das disciplinas e das especializações, e, nos países onde a edição escolar é da alçada do setor privado, a concorrência seguidamente encamiçada a que se entregam as empresas, contribuem para inflacionar o número de títulos disponíveis. Assim, na França, às vésperas da promulgação das leis escolares, em 1879, Ferdinand Buisson já assinalava "a incessante, a inesgotável produção dos livros clássicos"s. Em julho de 1888, 1531 títulos estavam sendo usados somente nas classes do ensino primário elementar. Recentemente, muitos manuais tiveram um número impressionante de reedições e de reimpressões (duas noções, aliás, freqüentemente confundidas propositalmente pelos editores)6, mas desde 1960, a longevidade das obras de classe foi consideravelmente reduzida: a aceleração do ritmo do progresso econômico, social, técnico e cultural, suscita a massificação do ensino e o desenvolvimento de inovações pedagógicas, e o recurso às novas tecnologias favoreceram, em inúmeros países, a renovação da produção, o crescimento e a diversificação da oferta editorial.7 5 Relatório apresentado por Ferdinand Buisson à M. le Ministre de I'Instruction publique sur I'admission des livres dans les écoles primaires publiques le 6 novembre 1879. Bulletin administratif du Ministere de [,Instruetion publique (nouvelle série), tome 18, n° 370, p. 681-683. 6 Podemos citar, entre outros titulos: Der Kinderfreund. de Friedrich Eberhard von Rochow, publicado pela primeira vez em 1776 na Alemanha; Le Tour de Ia Franee par deux enfants, Devoir et patrie, de G. Bruno, que na França teve 432 edições pela editora Belin, em oitenta e três anos de produção (1877-1960); Uisebok jõr folkskolan, publicado na Suécia em 1868 e reeditado até 1922; Latin Primer. de Benjamin Kennedy, que diversas versões dominaram o mercado britãnico de 1866 até os anos de 1920; Cuore. de Edmondo de Amicis, para a Itália que, publicado em 1886, alcançou um milhão de exemplares em 1923; Juanito, para a Espanha, uma adaptação do Gianneno. de Luigi Alessandro Parravicini, publicado pela primeira vez na Itália em 1837; The New England Primer ou ainda os MeGuffey Ecleetie Readers que tiveram 122 milhões de exemplares vendidos nos Estados Unidos entre 1836 e 1920; etc. 7 Na França, o número de novidades propostas anualmente foi multiplicada por mais de cinco em aproximadamente quarenta anos ( 450 no fim dos anos 1950, 2457 em 1999). Esse fenômeno é ainda mais marcante na Espanha como na Itália, países comparativamente menos populosos. Também a banalização, a abundância e a ampla difusão das produções escolares dissuadiram, evidentemente, conservadores e amadores de livros de toda veleidade patrimonial: os livros de classe, que ocupam o segundo lugar, logo ap6s a imprensa peri6dica, quanto ao consumo de papel, acham-se assim, paradoxalmente, ameaçados de desaparecimento físico. A profusão de títulos, mas também a longevidade e a multiplicidade de reedições que caracterizaram os manuais até as últimas décadas, não instigaram os bibli6grafos a empreender trabalhos de catalogação comparáveis àqueles que dizem respeito aos incunábulos ou às edições raras: até os anos 1960, as bibliografias ou os catálogos especificamente consagrados à literatura escolar são, por sua vez, muito raros e muito parciais8• O pouco interesse demonstrado, até estes últimos vinte anos, pelos manuais antigos e pela sua hist6ria decorre não somente das dificuldades de acesso às coleções, mas também de sua incompletude e sua dispersão. Ou talvez, ao contrário, devido a grande quantidade de sua produção, a conservação dos manuais não foi corretamente assegurada. É o caso em um país reputado e centralizado como a França, no qual a obrigação do dep6sito legal, instaurado em 1543, foi, portanto, objeto de particular atenção das autoridades, desde 1810: os livros de classe não estiveram sempre submetidos ao mesmo rigor que as outras publicações impressas, especialmente aqueles que se destinavam ao ensino primário. Se a Bibliotheque Nationale de France detém, hoje, pelo menos um exemplar de 85 a 90% dos títulos publicados, está muito longe de conservar o conjunto das edições; situação idêntica ocorre com a biblioteca uploads/Geographie/ o-historiador-e-o-livro-escolar.pdf
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- Publié le Jul 30, 2021
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